Linhas Rosa e Amarela do metropolitano do Porto avançam sem autorização ambiental legítima - 2021.04.13



Quatro associações do Porto, de defesa do ambiente e do património, publicam uma Carta Aberta sobre o arranque das obras das Linhas Rosa e Amarela do Porto sem autorização ambiental legítima: ACER - Associação Cultural e de Estudos Regionais, Campo Aberto - associação de defesa do ambiente, Clube Unesco da Cidade do Porto e NDMALO-GE Núcleo de Defesa do Meio Ambiente de Lordelo do Ouro - Grupo Ecológico denunciam ausência de autorização ambiental legítima no arranque das obras das Linhas Rosa e Amarela do Metro do Porto. Veja-se adiante:

LINHA ROSA E LINHA AMARELA AVANÇAM SEM AUTORIZAÇÃO AMBIENTAL
CARTA ABERTA À AGÊNCIA PORTUGUESA DO AMBIENTE


 
Carta Aberta ao Exmo. Senhor
Presidente da Agência Portuguesa do Ambiente - APA


As quatro associações signatárias têm vindo há meses a alertar as autoridades e o público para incongruências inexplicáveis no processo de autorização ambiental das obras relativas às Linhas Rosa e Amarela, no Porto e em Gaia.

É com surpresa e apreensão, por isso, que assistimos às notícias que dão conta do arranque das obras da Metro do Porto relacionadas com a construção da Linha Rosa (Linha Circular - Troço Liberdade/ S. Bento – Boavista/Casa da Música) e prolongamento da Linha Amarela (Extensão da Linha Amarela desde Santo Ovídio a Vila d'Este e Parque de Material de Vila d'Este) sem a necessária aprovação da APA - Agência Portuguesa do Ambiente presidida por V. Exa.

Pensamos que esta estupefação é partilhada por todas as pessoas atentas e preocupadas com a sua comunidade, que acreditam no primado da lei e que reconhecem a importância do papel desempenhado pelo organismo presidido por V. Exa. na garantia de algum equilíbrio entre as necessidades de desenvolvimento económico e social, a preservação do escasso património natural das cidades e a sustentabilidade ambiental, sem a qual, como sabemos, não há desenvolvimento que nos valha.

 

AINDA POR PUBLICAR AS DECLARAÇÕES DE CONFORMIDADE AMBIENTAL

Perguntamos como é possível o avanço das referidas obras se estão ainda por publicar as respetivas Declarações de Conformidade Ambiental (DECAPE), decorrentes da análise dos Relatórios de Conformidade Ambiental (RECAPE) apresentados pela Metro do Porto e dos resultados dos processos de Consulta Pública promovidos pela APA e que decorreram em junho de 2020. Recordamos que, em reunião que V. Exa. amavelmente nos concedeu, em novembro de 2020, quando questionado sobre o que, já na altura, nos parecia ser alguma demora na publicação das DECAPE, nos disse que tinham pedido uma prorrogação do prazo, dada a complexidade dos dois processos e na medida em que pretendiam tomar decisões devidamente ponderadas e sustentadas.

A consulta do site da APA e do portal Participa disso dão nota:  os dois processos permanecem identificados como «em análise». Em ambos os casos, a decisão final não foi portanto ainda publicada. De acordo com a lei, só após a publicação desta declaração é que a Metro do Porto estaria autorizada a avançar com os referidos empreendimentos. E o presidente da Metro do Porto estava perfeitamente ciente disso mesmo quando, em  1 de outubro de 2020, nos disse que, se o RECAPE apresentado não fosse aprovado, teriam que elaborar, como é evidente, um novo Relatório, alinhado com as determinações da Declaração de Impacte Ambiental (DIA).

Para tentar compreender esta incongruência, realizámos, ao longo dos últimos meses, sucessivas diligências junto dos vossos serviços, telefonicamente e via email, mas todas elas infrutíferas.

 

ESCLARECIMENTO A QUE TEMOS DIREITO

Perante este silêncio, resta-nos dirigir a V. Exa. esta Carta Aberta, solicitando o esclarecimento a que temos direito como cidadãos: quando será publicada a decisão final da APA relativamente a estes dois projetos? Como é que a APA se posiciona relativamente ao avanço das obras sem a sua autorização?  O que pretende fazer?

Isto porque, e recordamos, os RECAPE apresentados pela Metro do Porto contrariam frontalmente determinações da DIA. E não se trata de pormenores. No caso da Linha Rosa, é exigida a preservação do Jardim de Sophia, à praça da Galiza, e, no caso da Linha Amarela, é determinada a conservação de um relevante habitat de sobreiros no Monte da Virgem. Estas disposições da DIA não são recomendações, não são sugestões, não são pedidos. São condições. Condições cujo cumprimento é exigido para que os projetos sejam autorizados. As Declarações de Impacte Ambiental são, portanto, vinculativas, mas os RECAPE – que  deveriam descrever as medidas capazes de garantir a conformidade dos projetos de execução relativamente às determinações da DIA – ignoram as determinações daquelas. Ou seja, não são verdadeiros relatórios de conformidade ambiental e, desse modo, não deveriam ser aprovados. E a verdade é que, aparentemente, (ainda) não o foram.

Então, o que leva a Metro do Porto a sentir-se autorizada não só a anunciar, mas a efetivamente iniciar os primeiros trabalhos das duas empreitadas? O que leva o presidente da Metro do Porto a declarar ter obtido «as declarações de conformidade ambiental dos projetos de execução» (Público, 22-03-21) quando essas declarações não existem ou não foram ainda divulgadas? E porque é que a autoridade ambiental isto parece permitir embora não se pronunciando publicamente? E porque é que a autoridade ambiental anui a este tipo de comportamento? Por que motivo o processo não é suspenso por determinação da APA que tem autoridade – e obrigação – legal para o fazer, já que o projeto de execução, em ambos os casos, não é respeitador da DIA?

 

PREOCUPAÇÃO AGRAVADA NO CASO DA LINHA ROSA


No caso específico da Linha Rosa a nossa preocupação é agravada por duas convicções.

A primeira é o facto de considerarmos muito deficitária a relação custo/benefício deste empreendimento. De facto, trata-se de uma linha de muito curta extensão situada numa zona urbana sensível, com previsíveis impactes de gravidade no património histórico e grande dano em alguns jardins da cidade emblemáticos. O serviço da Linha Rosa seria mais bem realizado por outro tipo de ligação, como uma linha de autocarros elétricos em corredor próprio e de alta eficiência, que a Metro do Porto propõe agora para outros troços onde também já esteve prevista a ligação subterrânea. Seria ainda uma oportunidade para reabilitar zonas de grande qualidade paisagística do Porto, tornando-as mais apetecíveis e apropriadas aos peões e menos para viaturas individuais que, tudo indica, terão de abandonar os centros das urbes mais cedo ou mais tarde.

A segunda é a preocupação suscitada por declarações do presidente da Metro do Porto, como aquelas que prestou ao jornal Público no dia 22 de março de 2021, quando, sobre a construção da Linha Rosa, afirmou: «não vamos usar tuneladoras, é com avanços sucessivos e em cada avanço há uma validação das condições de geotecnia. Por isso recorremos a uma assistência técnica especial, que significa que o projetista vai estar no terreno, 24h por dia, sete dias por semana, 365 dias por ano, para fazer essa validação diária do processo de avanço do túnel.» Parece-nos que esta afirmação deveria ser razão mais do que suficiente para V. Exa. determinar a imediata suspensão do projeto de construção da Linha Rosa, por não ser aceitável que se avance para um empreendimento desta natureza com este grau de desconhecimento do terreno e de imprevisibilidade do projeto. Perante as dificuldades no subsolo do trajeto da Linha Rosa referidas publicamente pela Metro do Porto, a APA não considera que o estudo geológico por ela até agora apresentado deveria ser completado por outro  mais direcionado para as questões de segurança na construção dos túneis?

A situação existente parece evidenciar que, ou a empresa Metro do Porto, ao contrário do que afirma, está a atuar sem as necessárias autorizações de ordem ambiental, ou que a Agência Portuguesa do Ambiente não está a proceder com transparência em relação aos cidadãos a que o seu estatuto a obriga. Insistimos por isso, agora publicamente, no pedido de esclarecimento sobre o processo de avaliação em curso e na adoção de medidas tendentes a suspender iniciativas do promotor tomadas sem a devida autorização da entidade a que V. Exa. Preside. Exortamos ainda a que sejam suspensas todas e quaisquer obras que possam desrespeitar, mesmo que apenas parcialmente, a DIA.

Na expectativa da resposta de V. Exa,

subscrevem-se,

pela Associação Cultural e de Estudos Regionais - ACER,
Antero Leite, presidente da direção
acer.geral@acer-pt.org

pela Campo Aberto – associação de defesa do ambiente
José Carlos Costa Marques, presidente da direção
contacto@campoaberto.pt

pelo Clube Unesco da Cidade do Porto
Fernando Guedes Pinto, presidente da direção
clubeunesco-cidadedoporto@sapo.pt

pelo Núcleo de Defesa do Meio Ambiente de Lordelo do Ouro – Núcleo Ecológico  NDMALO-GE
Belmiro Cunha, presidente da direção
ndmalo@hotmail.com

 

Para resposta em correio em papel:

Clube Unesco da Cidade do Porto
Rua Dr. Ricardo Jorge, 19-2.º Direito  Sala 2
4050-514 PORTO